domingo, 7 de novembro de 2010

Pessoa e V Império



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Caeiro, poeta materialista, é de facto o verdadeiro reconstrutor do paganismo (p. 115). António Mora é o continuador filosófico de Alberto Caeiro. A ele compete provar a verdade metafísica e prática do paganismo; a ele cabe reatar a tradição perdida da obra negra (que não é nem romana nem semita); a ele cabe reconstruir o naturalismo grego, como consta da Athena e do programa do periódico; a ele cabe atacar de frente o espírito filosófico, "que data, na sua forma mais recente, de Kant, e que pretende centralizar no homem e na consciência individual a realidade do Universo"; a ele cabe fazer guerra directa a quantas formas literárias pertencem ao misticismo cristão; a ele cabe combater as ideias imperialistas, colectivistas, humanitárias (p. 139-140). Mora, o autor das obras teóricas que são o Regresso dos Deuses e o Paganismo Superior pretende, como Nietzsche, acabar com a metafísica e inventar um começo novo para lá da metafísica, identificada como platónica, inclusive na sua versão cristã definida como hiperplatonismo. Nietzsche diz de facto que o cristianismo é um platonismo para o povo. Para contrariar essa deriva vai beber nas fontes gregas (Heraclito, Homero) afim de aí encontrar os recursos de um pensamento positivo que oponha ao "niilismo europeu". E pretende ainda fundar uma nova definição do sujeito (como não-sujeito) e uma nova definição do homem como "Superhomem". Repare-se entretanto que na descrição que faz do Neo-Paganismo Português, Fernando Pessoa acredita, como os neo-platónicos, no Intermediário Intelectual, Logos na linguagem dos filósofos, Cristo (depois) na mitologia cristã.

Por mais de uma vez se aproximou a Mensagem de Pessoa à luz do paradigma utópico. Sabemos que o conceito de panteísmo serve de base à tematização do sebastianismo pessoano (2). De acordo com L. F. Teixeira, "mesmo a noção messiânica deve ser entendida como génese do Homem Total, aliás à semelhança do que aconteceu, entre outros, com o projecto de Sampaio Bruno" (3). Não vou entrar na diiscussão de um paganisno tipicamente português, com bases numa "cristologia pseudobucólica" e num "paganismo transcendentalista" que estaria patente no VII poema do "Guardador de Rebanhos" e na figura crística de D. Sebastião. Acontece que uma vez só nas Obras de António Mora se fala de messianismo, como o segundo elemento que fundamenta a religião cristista. O segundo elemento de onde deriva a moral do cristismo é o monoteísmo estreito e intolerante, o moralismo farisaico, o messianismo já desnacionalizado dos hebreus, corrupto já pela contínua intromissão de elementos orientais, na sequência, aliás, da tradição orientalizante do espiritismo judaico (p. 230).
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in:  http://triplov.com/coloquio_4/mourao.html

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